

A questão da renovação e reabilitação urbana na RAEM deveria ser considerada como uma prioridade absoluta pelo Governo da Região Administrativa Especial de Macau e que fosse imperativo que fossem tomadas medidas urgentes para proceder à renovação dos edifícios antigos, especialmente aqueles situados na zona norte da cidade. Estes edifícios, muitos dos quais se encontram em estado de degradação severa, apresentam um elevado risco para a saúde pública, com espaços comuns e privados extramente sujos, insalubres e inseguros para os seus residentes, que incluem um grande número de idosos e crianças de tenra idade. A lentidão e a falta de transparência neste processo de renovação e reabilitação urbana têm gerado um sentimento crescente de insatisfação entre a população, que se vê forçada a viver em condições bastante precárias.
Por outro lado, e regularmente e durante muitos anos, o nosso Gabinete de Atendimento aos Cidadãos tem recebido um número considerável de pedidos de apoio por parte de residentes que expressam preocupações sobre os elevados montantes das verbas angariadas para a reparação e renovação de edifícios no território. Para além desses valores serem muito elevados que é imposto subsequentemente a cada fração de habitação, eles não incluem a reparação das instalações interiores, cujos custos estão, lamentavelmente, fora do alcance do cidadão comum. A opacidade em relação aos detalhes dos custos envolvidos nos projectos, que nunca foram divulgados, levanta sérias dúvidas sobre a razoabilidade e o destino das verbas angariadas. Além disso, em certos casos, as companhias gestoras de propriedades, exigem que as despesas adicionais incorridas com empresas de consultoria, sejam partilhadas pelos proprietários minoritários, o que é absolutamente inaceitável.
Muitos proprietários têm questionado o ajustamento do rácio de repartição das despesas, mas algumas companhias têm-se recusado a abordar a questão, argumentando que já foi tratada no passado.
É frustrante constatar que a comissão de gestão das propriedades não considerou os pontos de vista dos proprietários minoritários ao apresentar as propostas de manutenção e que existem problemas graves com o mecanismo de tomada de decisão.
Adicionalmente, de acordo com as disposições relevantes da Lei de Macau n.º 14/2017, “Regime Jurídico da Administração das Partes Comuns do Condomínio”, e da Lei n.º 14/2021, “Regime Jurídico da Construção Urbana”, observam-se algumas ambiguidades na classificação das obras de um prédio de habitação plana e na sua autoridade fiscalizadora. Esta falta de clareza gera confusão e injustiça na resolução dos problemas enfrentados pelos proprietários minoritários e na autoridade de gestão na execução das obras.
Existem dois quadros jurídicos distintos para a classificação das obras e da entidade reguladora dos edifícios de apartamentos. Segundo o artigo 14.º da Lei n.º 14/2017, “Regime Jurídico da Administração das Partes Comuns do Condomínio”, entendem-se por “obras de inovação” três tipos de intervenções: obras realizadas na parte comum de um prédio urbano que sejam visíveis do exterior; obras que impliquem alterações nas colunas, pilares, paredes principais e outras partes estruturais do edifício; e obras destinadas a alterar a utilização das partes comuns. Por outro lado, a Lei n.º 14/2021, relativa ao Regime Jurídico da Construção Urbana, define “obras de alteração” como intervenções que realizam alterações parciais sem aumentar a área útil ou a altura do edifício, excluindo modificações maiores ou completas da estrutura.
Contudo, a definição de “obras de inovação” não está totalmente alinhada entre estes dois enquadramentos legais, e a autoridade reguladora não está claramente definida entre os Serviços de Habitação e os Serviços de Solos e Construção Urbana. Isso significa que, em situações que exigem a renovação de paredes exteriores ou a instalação de novos tubos de drenagem de ar condicionado, não está claro se tais intervenções são classificadas como “obras de inovação”, “obras de alteração” ou “obras de reparação”. Segundo a Lei n.º 14/2017, “obras de inovação” requerem o consentimento de dois terços dos proprietários, enquanto “obras de reparação” apenas requerem 15%.
Na prática, o Instituto de Habitação deixou a definição dessas obras para a Direcção dos Serviços de Solos e Construção Urbana, e o âmbito das “obras de inovação” não está claramente definido no quadro jurídico da Direcção dos Serviços de Solos e Construção Urbana.
Esta ambiguidade regulamentar tem deixado os proprietários minoritários sem saber como proceder. Especialmente em casos que envolvem a angariação de fundos de elevado valor, as entidades gestoras podem, de facto, realizar “obras de inovação” sob a classificação de “obras de manutenção”, contornando assim o requisito de consentimento de dois terços dos proprietários. Quando os proprietários pedem a intervenção do Instituto de Habitação, são aconselhados a resolver o litígio contratando um advogado e recorrendo ao tribunal, o que não só aumenta os encargos financeiros como também permite que a entidade gestora abuse da sua “posição leonina” na falta de regulamentos claros, exacerbando ainda mais a injustiça da situação.
Assim, é responsabilidade do Governo definir claramente os critérios que distinguem “obras de inovação” e “obras de alteração”, bem como clarificar a autoridade de supervisão dos serviços envolvidos. Isso é fundamental para evitar que os proprietários minoritários sejam forçados a suportar custos elevados devido à falta de orientações claras e, ao mesmo tempo, impedir que as autoridades de gestão ajam de forma arbitrária na classificação das obras. Apenas com um quadro jurídico claro e uma autoridade de controlo bem definida poderão os direitos e interesses legítimos dos pequenos proprietários ser protegidos, promovendo a equidade e a transparência na gestão dos edifícios de apartamentos.
Além da necessidade de diferenciar claramente as definições de “obras de inovação” e “obras de alteração”, o Governo deve estabelecer um limite máximo para o montante do capital a mobilizar para obras de manutenção e estipular a percentagem correspondente de consentimento dos proprietários em função do montante. Atualmente, a aprovação das “obras de conservação” requer apenas 15% de consentimento, mas quando o montante é excessivo, em alguns casos com mais de 100.000 patacas a dividir por cada agregado familiar, essa percentagem é irrealista e está fora do alcance do cidadão comum.
A legislação atual não estabelece um limite máximo para os fundos a angariar para obras de manutenção, nem ajusta a proporção do consentimento dos proprietários em função do montante. Isso permite que a autoridade de gestão, em nome das “obras de manutenção”, promova obras de elevado custo através de um rácio de consentimento de baixo limiar, transferindo assim pesados encargos financeiros para os proprietários minoritários.
Deste modo, o Governo deve urgentemente formular normas relevantes para a classificação e gestão dos montantes cobrados para obras de manutenção. Este mecanismo de classificação e gestão não só protegerá melhor os interesses dos proprietários de pequenas propriedades, como também evitará os encargos adicionais para as finanças familiares causados por elevados custos de obras, mantendo a estabilidade e a harmonia sociais. Os custos elevados dos projetos não afetam apenas a subsistência das famílias individuais, mas também podem ter um impacto negativo no desenvolvimento socioeconómico da sociedade como um todo. Portanto, enquanto o Governo aperfeiçoa a definição de obras, deve também estabelecer normas claras sobre o montante dos fundos a angariar e formular uma percentagem correspondente de consentimento dos proprietários, visando uma gestão justa, transparente e sustentável dos edifícios.
Por outro lado, embora a legislação em vigor imponha certas regras sobre o comportamento das autoridades de gestão, na prática, a falta de um mecanismo de controlo eficaz frequentemente resulta na não conformidade com os requisitos. Quando os proprietários questionam as práticas das autoridades de gestão e solicitam informações pertinentes, muitas vezes estas adotam uma postura evasiva ou até se recusam a comunicar.
De acordo com a legislação, os proprietários devem tentar negociar primeiro, apresentando um recurso por escrito, e se isso falhar, resolver o litígio judicialmente. No entanto, muitas entidades gestoras não se empenham ativamente na negociação, ignorando ou atrasando as solicitações, obrigando os condóminos a recorrer a advogados e a levar os casos a tribunal. Esta situação não só consome tempo e recursos, como também coloca os proprietários numa posição desvantajosa.
Os processos judiciais, sendo morosos e dispendiosos, levam muitos proprietários a desistir das suas reivindicações devido a pressões financeiras, permitindo que as entidades gestoras explorem a complexidade e os custos dos litígios para reprimir os proprietários. Este mecanismo injusto agrava ainda mais o desequilíbrio de poder entre proprietários minoritários e autoridades de gestão, aumentando a possibilidade de abusos de poder e levando a situações de “encorajamento” por parte das autoridades na ausência de supervisão eficaz. Portanto, é crucial que o Governo intervenha e melhore o mecanismo regulatório pertinente, visando equilibrar os interesses de todas as partes e manter a harmonia social.
Além disso, o atual regime de incentivos para a manutenção de edifícios e os empréstimos sem juros deveriam aliviar a pressão financeira sobre os proprietários, mas apresentam irracionalidades no seu processo de candidatura. Os empréstimos só podem ser pagos após a conclusão das obras, o que significa que, se a entidade gestora exigir que mais de 70% do capital seja angariado antecipadamente, os proprietários precisam angariar 100% dos custos das obras antes de obter os fundos da segunda fase do empréstimo. Esta disposição compromete a função do regime de aliviar os encargos financeiros dos proprietários.
Estatísticas recentes indicam que em Macau existem cerca de 5.000 edifícios com mais de 30 anos, e aproximadamente 14% do total têm mais de 40 anos. Se não forem adotadas medidas para melhorar as taxas de manutenção excessivas, a sociedade enfrentará uma série de problemas sociais, afetando a harmonia e a estabilidade social. Há relatos preocupantes de proprietários que tentaram suicidar-se devido à pressão financeira, e muitos jovens proprietários que se sentem desesperados por não conseguirem equilibrar os custos de manutenção com as suas obrigações financeiras, como a hipoteca de uma casa.
A manutenção dos exteriores dos edifícios é uma responsabilidade comum dos proprietários, mas não pode ser utilizada como um instrumento de pressão financeira excessiva. É através da intervenção ativa do Governo e da melhoria do sistema que será possível equilibrar a relação de poder entre as entidades gestoras e os proprietários de apartamentos, evitando abusos e promovendo um ambiente de gestão imobiliária justo e transparente.
Face ao exposto, venho solicitar os seguintes esclarecimentos, de uma forma CLARA, PRECISA, COERENTE, COMPLETA, e em tempo útil, às seguintes questões:
- Existe algum sistema de controle sobre as normas de cobrança, repartição e limiares de decisão para obras de manutenção de edifícios antigos? Como garante o Governo da RAEM a equidade na repartição das taxas e a transparência no mecanismo de decisão? A legislação actual prevê que apenas 15% de consentimento dos proprietários é suficiente, mas será que esse rácio é representativo da vontade total dos proprietários?
- Vai o Governo de Macau rever e melhorar o processo de candidatura ao regime de incentivos para a manutenção de edifícios, permitindo o pagamento antecipado de uma percentagem dos empréstimos na fase inicial ou parcialmente concluída das obras, para aliviar a pressão financeira sobre os proprietários?
- Irá o Governo de Macau rever as definições de “reparação” e “renovação” na Lei n.º 14/2017, uniformizando as normas de controle entre os IH e a DSSCU para evitar ambiguidades e abusos? Considera o Governo iniciar rapidamente o processo de alteração da Lei n.º 14/2017 para abordar as lacunas existentes, especialmente no que se refere à quórum necessário para a profusão de deliberação?